quarta-feira, 1 de outubro de 2014

BAIXAS ASPIRAÇÕES




De cima, desejos abaixo,
de baixo, suspeitas acima:
mas suspeitas de quê?

Não! há somente suspeitas
e não alguém a suspeitar
do que está por cima,
nalgum ponto mediano,
que nem precisa estar no meio,
no exato ponto em que
esse desejo partido
encontra-se com subida suspeita.

De cima rola incessante,
qual rocha com o tempo arredondada,
o desejo que do alto olhou
e rumou ao baixo, apressado.

De baixo a suspeita se esforça
para boa altitude ganhar,
elevando-se a quase desejo,
já um desejo de chegar
em cima...

Desejos baixos desejam ascender
e dessas faíscas primordiais
suspeita-se de que logo virá
fogaréu capaz de subir
colinas acima, riachos abaixo.

Sobre altos desejos suspeitas não há.
Há só quando eles,
no mirante dos olhos a queimarem,
debruçam-se vendo abaixo,
sobre si suspeita grassar:
se se mantêm altos como desejos,
é só desejo e fome não é;
se se abaixa, atraído
pelas suspeitas que há,
debruçado, perde o equilíbrio
e lascas de si caem no alto mar,
aumentando suspeitas de baixo,
de baixo desejo.

Não há altas suspeitas
nem baixas há.
Há só a inveja
de um desejo no alto,
acima de si colocado
e que se deixa cair
em fragmentos por ali,
uns pedaços rolados
do que no alto resiste de baixo.

Excluamos a justa medida,
nenhum ponto de encontro,
nenhum aperto de mão,
nada de acordo de cavalheiros:
só um cavalo alado,
que é o desejo do alto,
querendo voar bem baixo,
que é o desejo consumado.

Se riem as suspeitas,
levantando-se a si mesmas,
suspeitas de que acima está.

Ria-se das suspeitas
que só podem suspeitar
do baixo que lhe dão,
enquanto baixo ou alto,
bem melhor é desejar,
mesmo que no alto,
mesmo que sob suspeita,
contanto que uma hora desça.

Pode até ser meio-dia,
ou duas horas já ser,
não é preciso ser meio,
nem é necessário ser dia:
é só deixá-lo descer.

Que venha o desejo do alto,
que role aos olhos suspeitos,
que caia arredondado no chão,
e assim agora bem baixo
possa olhar sua antiga altura.

E se suspeitas tiver,
isso é só o desejo
de lá para cima voltar
e de novamente lançar-me no abismo,
satisfeito desejo.



CHICO VIVAS

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