quinta-feira, 1 de outubro de 2015

GOTEJANTE



Os minutos pingaram
Na superfície do meu tempo:
Incerto.
E ali formaram
Repetidos círculos concêntricos.

Meus minutos eram pedras,
Pequenos seixos rolados
Sobre o espelho do meu tempo desperto
E formando repetidas horas
Sem um centro definido,
Embora ao meio-dia
O sol se reparta em raios
(o raio que o parta!)
Caindo diretamente
Sobre meus olhos molhados,
Separando o dia que chegou
Da madrugada tantas vezes fria,
Do mesmo dia que se entrega
À avidez dos instantes famintos
Por novas penumbras a vislumbrar
No horizonte tardio
Da superfície rosa do dia.

Não conto os minutos,
Não conto as pedras,
Não repito as horas,
Não reparto o dia,
Não olho fixamente para o sol
Para que dos meus olhos
Não pinguem gotas
Como se instantes fossem,
Caindo no chão,
Rolando antes pelo rosto:
Que é o espelho
Do meu próprio tempo:
Incerto.

Se para despertar na hora,
O relógio ao lado acerto,
Seu tic-tac repetido
Soa-me como seixos rolados
Caindo eternamente num lago.
E sem que eu veja, imagino,
Os círculos concentrados na água
E me esqueço do tempo
Que o relógio consome.

Insone ainda,
Apesar de tanto contar,
De tantos lanosos animais contar,
Volta-me o som dos minutos,
Como num minueto,
Caindo do céu
Diretamente no mar,
E sem que eu possa escutar,
Imagino o tic-tac,
Tic-tac,
Tic-tac,
Das ondas a marulhar.
E assim mais das minhas horas
Se vão embora.

E tanto foi, que,
Desperto,
O sol já sacrificou as sombras,
Álgidos fantasmas sem lençol
E já segue célere, covarde,
Para sacrificar à realidade
As penumbras tenebrosas,
E em hino de luz louvar
O dia,
As horas,
Meus minutos.

E se então cai
Uma inusitada chuva,
Todo esse meu tempo,
Que nem é tanto assim,
Se esvai,
Aos pingos,
Gotejante,
Correndo pelos cantos,
Acumulando-se em poças,
Como o que,
Dos meus olhos empoçados,
Escorre,
Pelos cantos...
Silenciosamente.


CHICO VIVAS

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