terça-feira, 1 de dezembro de 2015

ALBA



 

Minha aurora é abrir os olhos
Que não fulgem dourados:
Fogem do sono eterno
De uma noite da qual mal me lembro
De ter começado
E impossível de se suspeitar
Se será acabada
Com um abrir de olhos
Encerrando a madrugada,
Soprando estrelas restantes, resistentes,
Afastando fantasmas,
Seres que se escondem,
Enquanto não brota a aurora.

Só nasceu o dia,
Ainda não fulgiu o sol
Do mesmo lado em que o sol brota
Todos os dias.
É só quando vem a luz,
Um sorriso gestado
Durante toda a noite dormida,
Que o sol nasce,
Saindo, rasgando,
Com dor costumada,
A ponto de não mais se sentir
Esse costume como uma dor.

Os lábios,
Tímidos, às vezes, em viverem
Como se nuvens em volta
Sua luz escurecesse.
Brincalhão, às vezes,
O sol entra e sai dos lábios
Como se hesitasse em nascer,
Quando apenas ele quer
Prolongar esse ante-alvorecer.
Devastados, às vezes,
Os lábios fazem o rosto tremer
Numa erupção que lava
A sonolência que persiste
Num jorro que leva
Para o dia o sorriso.

Meu meio-dia é,
Apesar do sol a pino,
Olhos arregalados aos céus,
Boca escancarada exibindo
Até seu próprio céu,
E nela imperando, corada,
A alegria no traçado dos lábios,
Arredondando-se para o alto
Numa alegria decalcada
Dessas horas cumpridas a fio,
A cada hora, a cada passo,
Passo da hora, hora do dia,
O sol cumprindo sua alegria,
Tão redondo como uma boca
Que come o sol com os olhos
Tão redondos quanto a boca.

Daí em diante, o sol,
Já cumprido metade do dia,
Começa lentamente a cair
E os lábios distendem-se,
Afrouxando o fio enrolado
No contorno feito a compasso
E vai, aos poucos ,voltando
A quase uma linha reta,
Lembrando o horizonte,
Nascente de toda esta história.

E daí para frente,
Ainda alegria:
Ou vão os lábios entortando-se,
Como se quisessem formar
Outro círculo, inferior,
O in-verso da alegria?

Puro engano!
Do sol não há contrário,
Nem mesmo a suposta lua,
Que é só o arbusto celeste
Atrás do qual o sol se satisfaz
De suas necessidades diárias,
Que não convém a sua majestade,
Satisfazer-se assim à luz do dia,
Após tantas horas compridas.
É hora, contudo, da noite
Vir render os passos a fio
Com os quais se adianta a vida
De todos os dias;
Descansar os lábios;
Evitar cãibras na boca;
Puxar pálpebras sobre os olhos
Como mãe preocupada
Com que seu filho frio não sinta nesta vida
E ainda aguarda para vê-lo
Adormecer com sorriso tão lasso,
Despertando o seu,
Próprio sorriso de mãe,
Nos seus lábios próprios
Sem que perceba a geometria
Que se vai aos pouco compondo,
Espantando o eclipse com essa alegria.

 
CHICO VIVAS

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