quarta-feira, 1 de junho de 2011

ROUPA DE CAMA



O lençol fino de seda gasta
cobre o corpo lasso e opaco:
o tal pano é tão gasto
que o brilho do lado sedoso
parece emergir direto do corpo
ali deixado
e já tão frio
e já tão gasto
que quase se confunde
com o lençol tecido
com fios emaranhados
das linhas inescritas
das urdiduras inexpressas
das tramas natimortas.

De súbito, um movimento:
mexe-se o pano,
anunciando a estreia,
ou mexe-se o corpo,
dando sinal de vida?

Foi só um vento indiferente
que avançou ao comprido
do pano,
do pano que recobre o corpo,
provocando ondas de seda,
como no panejamento
de um santo em pose clássica,
em êxtase barroco.


Um vento, agora apressado,
levanta o pano
como se olhos bem curiosos
não se contentassem
com o espetáculo à mostra
e à vista do mistério,
invadissem as coxias.

E não é um corpo apenas que jaz
sob a fina coberta de seda:
são dois.
Tão gastos,
tão lassos,
cansados de serem um só.

Ao terceiro sinal,
não o começo que se espera,
mas o fim:
é esperar para (não) ver.




CHICO VIVAS

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